Esse texto começa com uma pequena história. Quando entrei no curso de Artes Cênicas da Universidade Estadual de Londrina (UEL), tive contato com alguns estudos do teatro, um deles a Commedia dell´arte.  E falei isso pra um aluno que estava no último ano do curso: Esse papo de Commedia dell´arte parece o Chaves , né?! Parece demais pra mim. Tomei uma cortada do aluno que estava quase acabando o curso: Imagina, se você falar isso aqui o pessoal vai endoidar. Passei o curso achando que eu estava equivocado, quase terminando ele descobri que não. Uns cinco anos depois que acabei ele, continuo pensando a mesma coisa, mas agora com um pouco mais de argumento, e resolvi compartilhar alguns pensamentos, que não pretendem ser verdades absolutas. 



           Vale lembrar que isso, de forma alguma, pretende desvalorizar uma pesquisa artística, poética, porque tenho acreditado que o mundo está precisando cada vez mais de artistas e incentivadores desses, isso, na verdade, é pra dizer que não tem nada demais gostar do que se gosta.

             Para quem começou a ler o texto e não sabe o que é comédia Dell arte, espera aí. A gente explica rapidinho, ou melhor, convido pra explicar quem explica isso bem, Margot:


Quando o conceito de Commedia dell´arte surgiu na Itália no começo do século XVI, inicialmente significava não mais que uma delimitação em face do teatro literário culto, a commedia erudita. O ator da dell´arte eram, no sentido original da palavra, artesãos de sua arte, a do teatro. Foram, ao contrário dos grupos amadores acadêmicos, os primeiros atores profissionais.  (BERTHOLD. p.353)


                A característica importante de se saber aqui, para justificar o texto, são algumas outras além dessas.  A Commedia dell´arte era feita por artistas de rua, que tinham uma natureza nômade e apresentavam-se muito em feiras e espaços públicos, logo, tinham que ter uma linguagem que o permitissem sobreviver de sua arte. Suas apresentações têm personagens fixos. Ou seja, o que ira mudar é o enredo que esses personagens estão inseridos, mas eles continuam tendo suas características. Até aí eu poderia dar o exemplo das séries do Netflix, seria quase isso?! Ainda não. Porque quero aproximar essa arte do séc XVI ao Chaves.

                Outra característica importante é: esses personagens têm ações bem marcadas. Essas ações seriam como aquele seu amigo que sempre que chega, ajeita o cabelo, entende?! É uma sequencia de gestos que caracteriza determinada pessoa. Isso é um pouco mais profundo quando pensamos na complexidade dos personagens, e nas ações que eles desenvolvem. A Commedia dell´arte tem isso, quando você vai estudar seus personagens, basicamente precisa aprender seu modo de andar, suas ações mais clássicas. Vai dizer que isso não tem lembra algumas coisas: O Kiko sempre chorando do mesmo jeito, o Seu Madruga sempre jogando o chapéu e pisando em cima, a Dona Florinda que sempre reage da mesma maneira quando chega o Professor Girafales. E você pode pensar; mas ah, são coincidências! Pois é, vou te falar de mais algumas então.

                Encontrei também outra característica muita marcante, as características que Roberto Goméz Bolaños colocou em cada personagem, nos permite um paralelo com os personagens da arte do séc XVI. Olha só: O Alerchino, da Commedia dell´arte, é o responsável por influenciar os conflitos entre as classes sociais. Ele anda com uma colher de madeira em seu cinto, caso consiga alguma comida, já está preparado para devora-la. É um personagem que está sempre esfomeado. Encontramos muitas semelhanças com o personagem principal da série, o Chaves.

                As semelhanças entre os personagens seguem, como o palhaço que fazia par com Arlequim e ,de certa forma, o invejava, era chamado de Brighella; vemos aqui muita influência do personagem Kiko. A Colombina, que era a mais esperta entre os palhaços da classe baixa, fazendo com que até o próprio Arlequim e o Brighella fossem tapeados por ela. Quem poderíamos colocar aqui? A Chiquinha! Temos também os Enamorados; representados pela Dona Florinda e o Prof. Girafales, o Seu Madruga, estaria perto do personagem Pantaleão. E assim por diante.

                É muito interessante notar aqui, não a desvalorização da Commedia dell´arte, mas como eu sugiro no texto, como um artista conseguiu pegar uma arte muito estudada academicamente e pesquisada por muitos grupos pelo mundo e aqui no Brasil também, e transformar alguns personagens, adicionar suas  nuances e seus conflitos, e conseguir que isso tivesse um alcance para pessoas que nunca ouviram falar da Commedia italiana. E claro que existem muitas diferenças, mas essas semelhanças são bem marcantes e instigantes de serem enxergadas. Dessa forma esse texto não nasce para tirar algum valor da Commedia dell´arte, mesmo porque nem acredito que um texto seria capaz de fazer isso, essa é apenas um ponto de vista de como um artista conseguiu adaptar esse trabalho, que tem origem na Itália, e trazer para a realidade Latino Americana, porque vale lembrar que o Chaves é uma série mexicana, e no Brasil causa muito empatia, e também é muito conhecido nos outros países da América Latina. Para mim, Roberto Bolaños conseguiu fazer a Commedia dell´arte Latino Americana do Séx XX.


Rafael de Barros


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

BERTOLD, Margot. História Mundial do Teatro. São Paulo: Perspectiva, 2006. 


Quer ler mais sobre isso? O Ed Santos fez um TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) na Universidade Federal da Paraíba:  Influência da Commedia dell´arte na dramaturgia do seriado Chaves

 

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